George Whitefield, na minha avaliação, foi tão decididamente o principal e o
primeiro dentre os reformadores ingleses do século passado, que não me desculpo
por oferecer algumas informações adicionais a seu respeito. O real bem que ele
fez, o caráter peculiar da sua pregação, o caráter privado do homem, são todos
pontos que merecem consideração. São pontos, posso acrescentar, a respeito dos
quais tem havido muita compreensão incorreta.
Esta
compreensão incorreta talvez seja inevitável, e não deveria nos surpreender. As
fontes para que se forme uma correta opinião a respeito de um homem como
Whitefield são necessariamente muito escassas. Ele não escreveu livros lidos
por milhões, de fama universal, como ‘O Peregrino', de Bunyan. Ele
não encabeçou cruzadas contra uma igreja apóstata com o apoio de uma nação e
príncipes ao seu lado como Martinho Lutero. Ele não fundou nenhuma denominação,
que ligasse sua fé aos seus escritos e preservasse cuidadosamente seus melhores
atos e palavras. Há Luteranos e Wesleyanos nos dias presentes, mas não há ‘Whitefieldianos'. Não!
O grande evangelista foi um homem simples e sincero, que viveu para uma coisa
apenas: pregar a Cristo. Fazendo isto, ele não se importava com mais nada. Os
registros a respeito desse homem são amplos e plenos nos céus, não há dúvida,
mas são poucos e escassos na terra.
Não
devemos esquecer, além disso, que muitos em todas as épocas não vêem nada em
homens como Whitefield senão fanatismo e entusiasmo. Eles abominam tudo que se
pareça com ‘zelo' em religião. Eles detestam todos os que viram o mundo de
cabeça para baixo, fogem do velho caminho da tradição e não deixam o diabo
sozinho. Tais pessoas, não tenho dúvidas, nos diriam que o ministério de
Whitefield somente produziu excitação temporária, e que sua pregação era mera
extravagância, não havendo nada de especial a ser admirado no seu caráter. E de
se temer que a dezoito séculos atrás houvessem dito o mesmo a respeito do
apóstolo Paulo.
A
pergunta, ‘Que bem fez Whitefield?' é uma pergunta que eu respondo sem a menor
hesitação. Eu acredito que o bem direto que ele fez às almas imortais foi
enorme. Eu vou adiante, - eu acredito que foi incalculável. Testemunhas dignas
de crédito na Inglaterra, Escócia e América registraram sua convicção de que
ele foi um instrumento na conversão de milhares de pessoas. Muitos, onde quer
que ele pregasse, foram não apenas satisfeitos, excitados, e arrebatados, mas
abandonaram seus pecados, e foram feitos reais servos de Deus. ‘Enumerar
pessoas', eu não esqueço, é em todos os tempos uma prática objetável. Somente
Deus pode ler os corações e discernir o trigo do joio. Muitos, sem dúvida, em
dias de excitação religiosa, são tidos como convertidos, os quais não o foram
de modo algum. Mas eu desejo que meus leitores compreendam que a minha alta
avaliação da utilidade de Whitefield é baseada em sólida base. Eu peço que
observem bem o que os contemporâneos de Whitefield pensavam sobre o valor de
seus labores.
Franklin,
o bem conhecido filósofo americano era um homem frio e calculista, um Quaker
por profissão, o qual, não é de se esperar, que viesse a fazer uma elevada
avaliação do trabalho de nenhum ministro. Ainda assim ele confessou: ‘era
maravilhoso ver a mudança logo efetuada através da sua pregação nos hábitos dos
habitantes de Philadelphia. De descuidados ou indiferentes sobre religião,
parecia como se o mundo inteiro estivesse se tornando religioso.' O
próprio Franklin, deve-se notar, foi o principal editor de obras religiosas na
Philadelphia, e a sua prontidão em imprimir os sermões e jornais de Whitefield
mostram o seu julgamento da influência que Whitefield exercia na mente dos
americanos.
Maclaurin,
Willison, Macculloch, foram ministros escoceses cujos nomes são bem conhecidos
no norte de Tweed, sendo que os dois primeiros merecidamente alcançaram elevada
posição como escritores teológicos. Todos eles têm testificado repetidamente
que Whitefield foi um instrumento na realização de imenso bem na Escócia.
Willison em particular diz, ‘que Deus o honrou com surpreendente sucesso
entre pecadores de todas as classes e convicções'.
O
velho Henry Venn de Huddersfield e Yelling foi um homem de forte bom senso,
assim como de grande graça. Sua opinião foi que ‘se a grandeza, extensão,
sucesso e a ausência de sentimentos interesseiros nos labores de um homem podem
conferir distinção entre os filhos de Cristo, então estamos autorizados a
afirmar que dificilmente qualquer um se igualou ao Sr. Whitefield'. Novamente
ele diz: ‘Ele foi abundantemente bem sucedido nos seus amplos labores. Os
selos do seu ministério, do início ao fim, estou persuadido, foram maiores do
que poderiam ser creditados se o número pudesse ser fixado. Uma coisa é certa:
sua espantosa popularidade devia-se apenas à sua utilidade, pois ele mal abria
a sua boca como um pregador e Deus conferia uma extraordinária bênção às suas
palavras.'
John
Newton era um homem perspicaz, assim como um eminente ministro do Evangelho.
Seu testemunho é: ‘Aquilo que determinou o caráter do Sr. Whitefield como
uma luz resplandecente, sendo agora sua coroa de júbilo, foi o singular sucesso
que o Senhor se agradou em conceder-lhe de ganhar almas. Parecia que ele nunca
pregava em vão. Dificilmente talvez haja um local em todo o extensivo âmbito de
seus labores onde possam ainda ser encontrados alguns que não o reconheçam
gratamente como seu pai espiritual.'
John
Wesley não concordava com Whitefield em vários pontos teológicos de não pouca
importância. Mas quando pregou seu sermão fúnebre, ele disse: ‘Temos nós
lido ou ouvido de alguma pessoa que tenha chamado tantos milhares, tantas
miríades de pecadores ao arrependimento? Acima de tudo, temos nós lido ou
ouvido de alguém que tenha sido um instrumento abençoado na condução de tantos
pecadores das trevas para a luz, e do poder de Satanás para Deus?'
Indubitavelmente,
estes testemunhos são valiosos, mas há um ponto que eles não mencionaram. Este
ponto é a quantidade do bem indireto que Whitefield realizou. Embora os efeitos
diretos dos seus labores tenham sido grandes, eu acredito firmemente, que os
efeitos indiretos foram ainda maiores. Seu ministério foi uma benção para
milhares que talvez nunca o tenham visto ou ouvido.
Ele
foi o primeiro, entre os evangelistas do século dezoito, a restaurar a atenção
para as antigas verdades que produziram a Reforma Protestante. Suas constantes
afirmações das doutrinas ensinadas pelos reformadores, suas repetidas
referências aos artigos, homilias e escritos dos melhores teólogos ingleses,
obrigaram muitos a pensar, compungindo-os a examinarem seus próprios
princípios. Se toda verdade fosse conhecida, eu acredito que comprovaria que a
ascensão e progresso do corpo evangélico da Igreja da Inglaterra recebeu um
poderoso impulso de George Whitefield.
Mas
este não é o único bem indireto que Whitefield fez em seus dias. Ele estava
entre os primeiros a mostrar o caminho correto para enfrentar os ataques dos
infiéis e céticos do cristianismo. Ele viu claramente que a arma mais poderosa
contra tais homens não é um debate metafísico e dissertações críticas, mas
pregar todo o Evangelho, viver todo o Evangelho, e disseminar todo o Evangelho.
Os escritos de Leland, do jovem Sherlock, de Waterland, e de Leslie, não
obtiveram a metade do sucesso que obteve a pregação de Whitefield e seus
companheiros em reprimir a enchente de infidelidade. Estes foram os verdadeiros
campeões do cristianismo. Infiéis raramente são abalados por meros debates
abstratos. Os argumentos mais certos contra eles são a verdade do Evangelho e a
vida do Evangelho.
Acima
de tudo, ele foi o primeiro inglês que parece ter entendido plenamente o que o
Doutor Chalmers apropriadamente chamou de sistema ofensivo. Ele foi o primeiro
a ver que os ministros de Cristo devem fazer o trabalho de pescadores de
homens. Eles não devem esperar que as almas venham a eles, mas devem ir atrás
das almas, e ‘compeli-las a entrar'. Ele não sentava comodamente ao lado de sua
lareira, como um gato num dia de chuva, lamentando-se a respeito da impiedade
do país. Ele saía para enfrentar o diabo na sua cidadela; atacava o pecado e a
impiedade face a face, e não lhes dava sossego. Ele penetrava nas ruas e becos
atrás de pecadores; caçava a ignorância e o vício aonde quer que eles pudessem
ser encontrados. Em resumo, ele aplicou um sistema de ação, que até o seu tempo
era comparativamente desconhecido no seu país, mas um sistema o qual uma vez
iniciado, nunca cessou de ser empregado até o dia de hoje. Missões nas cidades,
missões nos grandes centros, sociedades de visitas distritais, pregações a céu
aberto, missões nacionais, serviços especiais, pregações em teatros, tudo são
evidências de que o valor do ‘sistema ofensivo' é agora generalizadamente
reconhecido por todas as igrejas. Agora nós entendemos melhor como trabalhar do
que entendíamos cem anos atrás. Mas nunca esqueçamos que o primeiro homem a dar
início a estes tipos de atividades foi George Whitefield. Vamos dar a ele o
crédito que merece.
O
caráter peculiar da pregação de Whitefield é o próximo assunto que demanda
algumas considerações. Os homens naturalmente desejam saber qual foi o segredo do
seu sucesso sem paralelo. O assunto está envolto em consideráveis dificuldades,
e não é tarefa fácil formar um julgamento correto a seu respeito. A idéia comum
de muitas pessoas de que ele era um mero e comum metodista exaltado, notável
por nada mais a não ser sua grande fluência, forte doutrina e uma poderosa voz,
não suporta uma momentânea investigação. O Dr. Johnson foi tolo o suficiente
para dizer, que‘ele vociferava e impressionava, mas não chamava mais atenção do
que um charlatão; e que ele chamava atenção não por fazer melhor do que os
outros, mas porque fazia algo estranho'. Mas Johnson foi tudo, exceto
infalível nas suas opiniões sobre pastores e religião. Tal teoria não tem
validade. Ela contradiz fatos inegáveis.
E
fato que nenhum pregador na Inglaterra jamais obteve tanto sucesso em atrair a
atenção de tão grandes multidões como Whitefield ao pregar constantemente ao
redor de Londres. Nenhum pregador jamais foi tão universalmente popular em cada
país que visitou, Inglaterra, Escócia e América. Nenhum pregador jamais manteve
sua influência tão completamente sobre seus ouvintes como ele o fez por 34
anos. Sua popularidade nunca desvaneceu. Ela era tão grande no fim dos seus
dias como o foi no início. Onde quer que ele pregasse, os homens deixavam suas
lojas e empregos para reunirem-se ao redor dele, e ouvir como quem ouve para a
eternidade. Só isso já é um grande fato. Obter a atenção das ‘massas' por um
quarto de século, e pregar incessantemente por todo este tempo é uma evidência
de um poder não comum.
Outro
fato, é que a pregação de Whitefield produzia um poderoso efeito em pessoas de
todos os níveis. Ele ganhou a admiração das altas e baixas camadas, dos ricos
assim como dos pobres, dos eruditos assim como dos ignorantes. Se a sua
pregação houvesse sido popular apenas entre os ignorantes e pobres, nós
poderíamos pensar na possibilidade de que havia pouco nela exceto declamação e
barulho. Mas, longe de ser este o caso, ele parece ter sido aceito por um bom
número de nobres e pessoas bem educadas. O Marquês de Lothian, o Conde de
Leven, o Conde de Duchan, o Lord Rae, o Lord Dartmouth, o Lord James A. Gordon,
poderiam ser citados entre os seus mais calorosos admiradores, além de Lady
Huntyngdon e uma grande quantidade de senhoras da Corte.
E
um fato que eminentes críticos e homens de letras, como o Lord Bolingbroke e o
Lord Chesterfield, foram pessoas que se deleitavam em ouvi-lo freqüentemente.
Era reconhecido que mesmo o frio e artificial Chesterfield aquecia-se com a eloqüência
de Whitefield. Bolingbroke disse: ‘Ele é o homem mais extraordinário do
nosso tempo. Ele tem a eloqüência mais impressionante que jamais ouvi em
qualquer pessoa.' Franklin, o filósofo, não mediu palavras ao falar dos
poderes da sua pregação. Hume, o historiador, declarou que valia a pena viajar
vinte milhas para ouvi-lo.
A
verdade é que fatos como estes não podem ser invalidados. Eles derrubam
completamente a teoria de que a pregação de Whitefield não foi nada, exceto
barulho e exaltação. Bolingbroke, Chesterfield, Hume, e Franklin não eram
facilmente enganáveis. Eles não eram juízes insignificantes de eloqüência. Eles
estavam provavelmente entre os críticos mais qualificados de seus dias. Suas
opiniões imparciais e sem preconceito parecem-me suprir uma prova
inquestionável de que deve ter havido algo muito extraordinário a respeito da
pregação de Whitefield. Mas, afinal, a questão permanece sem ser respondida:
qual foi o segredo da popularidade e efetividade sem rival de Whitefield? Eu
admito francamente que, devido à escassez das fontes que possuímos para formar
nosso julgamento, a pergunta é difícil de ser respondida.
A
pessoa que folhear os 75 sermões publicados de autoria de Whitefield,
provavelmente ficará muito desapontada. Ela não verá neles um intelecto
imponente ou profundidade de mente. Não achará neles uma profunda filosofia,
nem pensamentos extraordinários. Mas, deve-se observar, entretanto, que a
grande maioria foi anotada abreviadamente por repórteres, e publicados sem
correção. Estes dignos homens parecem ter feito seu trabalho muito
indiferentemente, e eram evidentemente ignorantes quanto à pontuação,
parágrafos, gramática, e quanto ao Evangelho. A conseqüência é que muitas
passagens nestes 75 sermões são o que o Bispo Latimer chamaria de uma
‘desfiguração', e o que nós chamaríamos hoje em dia de uma completa desordem.
Não é de admirar que o pobre Whitefield tenha dito em uma de suas melhores
cartas datada de 26 de setembro de 1769: ‘Eu desejaria que você tivesse
advertido contra a publicação de meu último sermão. Ele não está tal qual eu
preguei. Em alguns lugares a publicação me faz falar com discordância, e até
sem sentido. Em outros lugares o sentido e a conexão são destruídos por
parágrafos desconexos, de modo que o todo está totalmente impróprio para a
leitura do público.'
Entretanto,
eu me aventuro a dizer ousadamente, que com todas as suas faltas, os sermões
impressos de Whitefield recompensarão sua leitura. O leitor deve lembrar-se de
que eles não foram preparados cuidadosamente para impressão, como os sermões de
Melville ou Bradley, mas foram pessimamente registrados, paragrafados, e
pontuados, devendo lê-los com isto continuamente em sua mente. Além disso, deve
lembrar-se que uma composição em inglês para ser falada a ouvintes, e uma
composição em inglês para leitura privada, são quase que duas línguas
diferentes; de modo que sermões bons para serem pregados são ruins quando
lidos. Lembremo-nos destas duas coisas, e julguemos de acordo, e eu estaria
muito enganado se não viéssemos a encontrar muito o que admirar em muitos dos
sermões de Whitefield. Da minha parte, eu devo dizer claramente que eles são
grandemente subestimados.
Deixe-me
agora destacar o que parece ter sido as características distintivas da pregação
de Whitefield.
Whitefield
pregava um Evangelho singularmente puro. Talvez poucos homens tenham dado aos
seus ouvintes tanto trigo e tão pouco restolho. Ele não se levantava para falar
sobre sua denominação, sua causa, seu interesse ou seu ofício. Ele estava
perpetuamente lhe falando a respeito dos seus pecados, do seu coração, de Jesus
Cristo, do Espírito Santo, da absoluta necessidade de arrependimento, fé e
santidade, do modo como a Bíblia apresenta estes importantes assuntos. ‘Oh,
que justiça a de Jesus Cristo!' Ele sempre dizia: ‘Eu devo ser
desculpado se menciono isso em quase todos os meus sermões.' Pregação
desse tipo é a pregação que Deus se deleita em honrar. Ela deve ser
preeminentemente uma manifestação da verdade.
A
pregação de Whitefield era singularmente lúcida e simples. O que quer que seus
ouvintes pensassem da sua doutrina, não podiam deixar de entender o que ele
queria dizer. Seu estilo de falar era fácil, claro e coloquial. Ele parecia
abominar sentenças longas e complicadas. Ele sempre tinha em vista o seu alvo e
se dirigia diretamente para lá. Ele dificilmente atrapalhava seus ouvintes com
argumentos obscuros e raciocínios intrincados. Afirmativas bíblicas simples,
ilustrações adequadas, e exemplos pertinentes, eram as armas mais comuns que
ele usava. A conseqüência era que seus ouvintes sempre o entendiam. Ele nunca
atirava acima das cabeças dos seus ouvintes. Aí está outro importante elemento
para o sucesso do pregador. Ele deve esforçar-se de todos os modos para ser
entendido. O arcebispo Usher tinha um ditado muito sábio: ‘Fazer coisas
simples parecerem difíceis é coisa que qualquer homem pode fazer, mas fazer
coisas difíceis, simples, é a obra de um grande pregador'.
Whitefield
era um pregador singularmente ousado e direto. Ele nunca usava aquela expressão
indefinida ‘nós', que parece tão peculiar nos nossos púlpitos, e que
apenas deixa a mente do ouvinte em um estado enevoado e confuso. Ele enfrentava
os homens face a face, como alguém que tem uma mensagem de Deus para eles: ‘Eu
vim aqui para lhe falar a respeito da sua alma.' O resultado era que
muitos dos seus ouvintes costumavam pensar que os seus sermões eram dirigidos
especialmente a eles. Ele não ficava contente como muitos, em apenas insistir
em uma aplicação pobre, como que um apêndice no final de um longo discurso,
pelo contrário, um constante veio de aplicação corria através de todos os seus
sermões. ‘Isto é para você, e isto é para você'. Seus ouvintes nunca
eram deixados sozinhos.
Outra
característica marcante da pregação de Whitefield era o seu singular poder de
descrição. Os árabes têm um provérbio que diz: ‘o melhor orador é aquele
que pode transformar os ouvidos dos homens em olhos.' Whitefield parece
ter tido uma faculdade peculiar para fazer isto. Ele dramatizava tão plenamente
seu assunto, que parecia fazê-lo mover-se e andar diante dos seus olhos. Ele
costumava traçar um desenho tão vivo das coisas que estava tratando, que seus
ouvintes podiam crer que na verdade as viam e ouviam. ‘Em uma ocasião,' diz
um de seus biógrafos, ‘Lord Chesterfield estava entre seus ouvintes. O
grande pregador ao descrever a miserável condição de um pecador não convertido,
ilustrou o assunto descrevendo um mendigo cego. A noite estava escura e o
caminho perigoso. O pobre mendicante foi abandonado pelo seu cachorro próximo
da beira de um precipício, e não tinha nada para ajudá-lo a apalpar seu caminho
senão sua bengala. Whitefield empolgou-se tanto com seu assunto e o descreveu
com tal poder gráfico, que todo o auditório ficou em total silêncio e sem
respirar, como se estivesse vendo os movimentos do pobre velho homem; e
finalmente, quando o mendigo estava a ponto de dar o passo fatal que o faria
precipitar-se do despenhadeiro para inevitável destruição, Lord Chesterfield
correu para salvá-lo exclamando em alta voz, ‘Ele caiu. Ele caiu!' O nobre Lord
tinha sido tão inteiramente arrebatado pelo pregador, que esqueceu-se de que
tudo era apenas uma descrição.'
Outra
característica dominante da pregação de Whitefield era o seu tremendo fervor.
Um homem pobre e sem educação disse que ‘ele pregava como um leão.' Ele
conseguia mostrar ao povo que ele pelo menos cria em tudo que estava dizendo, e
que o seu coração, alma, mente, e força, estavam empenhados em fazê-los
acreditar nisto também. Os seus sermões não eram como os disparos vespertinos
de canhão em Portsmouth, um tipo de descarga formal, disparada continuamente,
mas que não perturba ninguém. Eles eram todos cheios de vida e de fogo. Não
havia como escapar deles. Dormir era praticamente impossível. Você tinha que ouvir
quer gostasse ou não. Havia neles uma santa violência que tomava de assalto a
sua atenção. Você seria facilmente conquistado por sua energia antes que
tivesse tempo de considerar o que fazer. Isto, podemos estar certos, era um dos
segredos do seu sucesso. Nós devemos convencer os homens, de que nós mesmos
somos sinceros, se quisermos ser acreditados. A diferença entre um pregador e
outro, freqüentemente não está tanto nas coisas que são ditas, quanto no modo
como são ditas.
Foi
registrado por um de seus biógrafos que um senhor americano foi ouvi-lo, pela
primeira vez, em conseqüência de um relato que ouvira dos seus poderes de
pregação. O dia estava chuvoso, a congregação comparativamente pequena e o
início do sermão um tanto quanto pesado. Nosso amigo americano começou a dizer
a si mesmo: ‘Este homem não é nenhum grande prodígio, afinal de contas'. Ele
olhou ao redor e percebeu a congregação tão pouco interessada quanto ele mesmo.
Um homem de idade, em frente do púlpito, havia adormecido. Mas subitamente,
Whitefield interrompeu. Sua expressão mudou. E então exclamou subitamente em um
tom alterado: ‘Se eu tivesse vindo falar a vocês em meu próprio nome, bem
que vocês poderiam descansar seus cotovelos em seus joelhos, e suas cabeças nas
mãos e dormir; e apenas olharem aqui e ali, dizendo:do que este tagarela está
falando? Mas eu não vim em meu próprio nome. Não! Eu vim em nome do Senhor dos
Exércitos!' (então ele baixou as mãos e os pés com tanta força que fez com
que o prédio tremesse), ‘E eu preciso ser ouvido.' A congregação
assustou-se. O homem de idade logo acordou. ‘Ah, Ah.” Gritou
Whitefield fixando nele os olhos, ‘eu o acordei, não foi? Era exatamente o
que eu tencionava. Eu não vim aqui para pregar a troncos e pedras: eu vim a
vocês em nome do Senhor dos Exércitos e preciso e terei uma audiência.' Os
ouvintes foram rapidamente arrancados de sua apatia. Cada palavra do sermão a
partir daí foi ouvida com profunda atenção, e o senhor americano nunca mais
esqueceu o episódio.
Outra
característica da pregação de Whitefield que merece uma nota especial era a
enorme carga de emoção e sentimentos que continha. Não era coisa incomum para
ele chorar profusamente no púlpito. Cornelius Winter, que freqüentemente o
acompanhou em suas últimas jornadas, foi tão longe ao ponto de dizer que
dificilmente o presenciara terminar um sermão sem algumas lágrimas. Mas, não
parece ter havido nada de fingimento nisto. Ele se emocionava intensamente
pelas almas diante dele e seus sentimentos encontravam uma saída nas lágrimas.
De todos os ingredientes do seu sucesso, nenhum, eu suspeito, foi tão poderoso
como este. Isto despertava afeições e tocava fontes secretas nos homens, as
quais nenhuma argumentação e demonstração poderiam mover. Isto suavizava os
preconceitos que muitos haviam concebido contra ele. Eles não podiam odiar o
homem que chorava tanto por suas almas. ‘Eu vim ouvi-lo,' alguém
disse a ele, ‘com os meus bolsos cheios de pedras, com a intenção de
quebrar a sua cabeça; mas o seu sermão alcançou o melhor de mim e quebrou o meu
coração.' Uma vez que alguém se torne convencido de que um homem o ama,
este ouvirá alegremente o que ele tem a dizer.
Eu
agora pedirei ao leitor que acrescente a esta análise da pregação de Whitefield
o fato de que até por natureza ele possuía vários dos dons mais raros, os quais
habilitam um homem a ser um orador. Seus gestos eram perfeitos - tão perfeitos
que até mesmo Garrick, o famoso ator, o louvava sobremaneira. Sua voz era tão
poderosa quanto seus gestos - tão poderosa que ele podia fazer com que trinta
mil pessoas o ouvissem de uma vez, e ainda assim tão musical e bem entoada que
alguns diziam que ele podia arrancar lágrimas pelo modo como pronunciava a
palavra ‘Mesopotâmia'.Sua postura no púlpito era tão curiosamente graciosa
e fascinante que era dito que as pessoas que o ouviam, em cinco minutos estavam
esquecidas de que ele era vesgo. Sua fluência e domínio de uma linguagem
apropriada eram da mais alta ordem, inspirando-o sempre a usar a palavra certa
e a colocá-la no correto lugar. Acrescente, eu repito, estes dons às coisas já
mencionadas e então considere se não há o suficiente em nossas mãos para
explicar seu poder e popularidade como pregador.
Da
minha parte, não hesito em dizer que acredito que nenhum pregador inglês jamais
possuiu tal combinação de excelentes qualificações como Whitefield. Alguns, sem
dúvida, o superaram em alguns dos seus dons; outros, talvez, o igualaram em
outros. Mas, quanto a uma combinação bem balanceada de alguns dos mais finos dons
que um pregador possa ter, unidos a uma voz, postura, estilo, gestos e domínio
de palavras, Whitefield, eu repito minha opinião, está sozinho. Eu acredito que
nenhum outro pregador inglês, morto ou vivo, jamais o igualou. E eu suspeito
que sempre descobriremos que exatamente na proporção em que um pregador se
aproxima dessa curiosa combinação de raros dons os quais Whitefield possuía,
exatamente nesta proporção eles obtém o que Clarendon define ser a verdadeira
eloqüência - ‘um estranho poder de se fazer acreditar.'
A
vida íntima e o caráter pessoal desse grande herói espiritual do século passado
são um ramo do meu assunto no qual não me demorarei. De fato, não há
necessidade para fazer isso. Ele era um homem singularmente transparente. Não
havia nada sobre ele que requeresse apologia ou explicação. Suas faltas e boas
qualidades eram ambas claras e evidentes como o meio-dia. Portanto, eu me
contentarei em simplesmente destacar as características proeminentes do seu
caráter até onde for possível serem deduzidas de suas cartas e dos relatos dos
seus contemporâneos, e então trazer meu esboço dele a uma conclusão.
Ele
era um homem de profunda e sincera humildade. Ninguém pode ler as suas mil e
quatrocentas cartas, publicadas pelo Doutor Gillies sem observar isto.
Repetidas vezes, no próprio apogeu de sua popularidade, nós o encontramos
falando de si mesmo e do seu trabalho nos termos mais baixos. ‘Deus, tem
misericórdia de mim, um pecador', ele escreve em 11 de setembro de 1753, ‘e
dá-me, por amor da Tua infinita misericórdia, um coração humilde, agradecido e
resignado. Eu sou verdadeiramente mais vil do que o mais vil dos homens, e fico
espantado de usares tal miserável como eu'. ‘Que nenhum dos meus amigos,' ele
escreve em 27 de dezembro de 1753, ‘clame a tal verme indolente, morno e
inútil: poupa-te a ti mesmo. Ao invés disso, estimulem-me, eu suplico, dizendo:
acorda, dorminhoco, e começa a fazer alguma coisa para o teu Deus.' Linguagem
como esta, sem dúvida, parece tolice e fingimento para o mundo; mas o leitor da
Bíblia bem instruído verá nela a experiência do coração de todos os santos mais
brilhantes. E a linguagem de homens como Baxter, Brainerd e M'Cheyne. E a mesma
inclinação que havia no inspirado Apóstolo Paulo. Aqueles que têm mais luz e
graça são sempre os homens mais humildes.
*Traduzido por Paulo R. B.
Anglada, a partir de J. C. Ryle, Christian Leaders of 18th. Century (reprint,
Edinburgh and Pennsylvania: The Banner of Truth Trust, 1978), 149-79. Revisado
por Cláudio Vilhena e Emir Bemerguy Filho.
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